Quando abrimos o portão da casa do artista Swoboda, há 28 anos joseense, nascido em Berlim, somos recebidos por Laika. uma elegante cadela que nos olha à distância. O nome Laika não surgiu por acaso. E o nome de uma cadela russa, primeira “astronauta a visitar o espaço cósmico. E o espaço cósmico, seus mistérios, sua projeção futurível é justamente um dos temas preferidos do artista Swoboda. A cidade tem uma grande dívida com ele. Conhece pouco o seu trabalho. Uma dívida lamentável para uma cidade que se diz “progressista”. Swoboda é um dos artistas brasileiros mais valorizados principalmente pelas galerias de arte de São Paulo e Rio de Janeiro.

Dono de uma técnica impressionante, perfeita, ele vê com ironia a falta de interesse dos joseenses pela sua arte. Diz, sentado no sofá de sua casa, contemplando Laika e olhando para uma bela paisagem verde no fundo de um ecológico quintal que aqui muitas pessoas preferem comprar reproduções baratas nos supermercados ou pedem uma tela verde para combinar com o sofá. Uma crítica mordaz em cima dos “novos ricos” joseenses. Muitos deles habitantes do bairro onde ele mora, o sofisticado Esplanada. Mas quem não conhece ainda a arte de Swoboda ou quer ver seus novos caminhos não deve perder sua exposição individual marcada para às 20:30 horas do próximo dia 20 na Galeria de Arte da Aliança Francesa (Rua Vilaça. 836). Esta será sua 13ª exposição individual e ele apresentará cerca de 30 trabalhos.

O engenheiro do Cosmo

A harmonia técnica de Swoboda é uma questão de sensibilidade. Mas também é óbvio que sua profissão de engenheiro ajudou. Ele fala rapidamente sobre sua vida de artista e engenheiro, hoje aposentado na tranquilidade de sua casa:

Nasci em 1910 em Berlim. Tornei-me engenheiro da aeronáutica e exerci minha profissão até 1945 na Alemanha e depois fui contratado para a França, onde trabalhei dois anos e meio em Paris. Em seguida fiz um contrato para a Inglaterra. Em 1952 foi chamado para o Brasil como especialista em helicópteros, trabalhando no CTA, onde foi finalmente chefe do escritório de projetos durante a criação dos protótipos do Bandeirante, cujo sucesso motivou a criação da Embraer. Como projetista tendo criado durante toda a vida formas funcionais e aerodinâmicas tive a base para o equilíbrio e a harmonia de meus quadros. Procuro a beleza geralmente em composições de formas simples concretas aproveitando o efeito tridimensional. O futuro e o espaço fazem parte do motivo dos meus quadros.

Um espaço novo

O crítico de artes plásticas Walmir Ayala disse sobre a arte do joseense Swoboda que: “Nada mais coerente do que a vocação de Hans Hermann Swoboda: engenheiro aeronáutico a pintor de aventuras espaciais. Sem dúvida, na conquista do voo, está implícita a mais inspirada missão do homem, ou seja, a de habitar um espaço novo, com a competência do pássaro, e este algo mais da inteligência criadora, que fez com que o experimento astronáutico chegasse a dimensões insuperáveis por qualquer outro ser do reino animal. Ainda que tudo até agora obtido, com esta ambição legendária. seja um tanto melancólico e desértico (veja-se a chegada à Lua), não se pode brecar o veloz processo de avanço dessas pesquisas. Aonde iremos? Quem sabe. Mas podemos ver, nesta exposição de Swoboda, aonde o artista pode ir, e ainda mais um artista instrumentado sobre o conhecimento científico e o sonho. Swoboda é um homem sério e exigente (como cultivador de plantas já declarou não possuir nenhuma planta ordinária). Sente-se que ele pensa com paciência e profunda atenção, e que age com a maior seriedade quando cria, seja um protótipo mecânico, seja a visionária paisagem de um quadro. Tecnicamente, atingiu a perfeição referente à linguagem que escolheu e admite variações temáticas que, de uma certa forma, não atraiçoam muito a ideia central do mundo novo. Por vezes joga com personagens que não valorizam muito a cena. por que o mundo da ficção científica é, a nosso ver, uma área antipersonalista.

Nela o homem será um número, se standardizará e o grande protagonista há de ser o espaço, e nele a paisagem silenciosa e cintilante. Isto se a realidade alcançar o projeto que a ficção científica de hoje vaticina. Não me lembro de ter visto antes de Swoboda, uma crônica interplanetária tão completa e válida. Seu universo parte de jogos geométricos, que propõem por virtual equilíbrio, a vitória contra a gravidade, e a elegância dos acoplamentos. Em alguns de seus trabalhos, a ficção inventa climas arcaizantes. como se os tótens e ídolos antigos fossem resíduos de presenças sobrenaturais concretizadas. Mesmo as paisagens aparentemente imediatas, são invadidas de uma luz transfiguradora, das quais a natureza surge como numa aurora genesíaca. Por vezes há um acento de humor, veja-se o quadro no qual a cadela Laika, aninhada em seu foguete, derrama aquele olhar humaníssimo que só os cães sabem ter, sobre o visor/vitrine de sua aventura. Mas o que nos deixa tensos de emoção são mesmo os espaços atravessados por soberanas espaçonaves, que o cientista Swoboda idealiza como um projeto exequível, e que nos aproximam da emoção sobre as “loucuras” de Júlio Verne. hoje transformadas em realidade. Esta sensação angustiante de que aquilo é uma previsão, é que torna tão sufocante e tensa a experiência deste pintor. Não se trata de um malabarista de imaginações pitorescas e alucinadas, mas, te-se, a secreta e pausada fórmula de um processo desenvolvido e coerente com tudo o que até agora já foi feito e provado. Aliada à grande beleza da cor ele fez levitarem as formas, as plataformas, os hangares, as rotas estelares, aproximando o infinito de uma possibilidade mortal de compreensão. Esta grande experiência que Swoboda nos comunica, numa sequência de obras principalmente originais e com momentos de uma nova poesia: a de uma perspectiva cósmica filtrada de todo o terror, investida de segurança e monumentalidade”.

Motivos diferentes

Mais do que 40 anos projetando, inventando, criando formas novas e funcionais como engenheiro da Aeronáutica e pintando paralelamente durante cada hora disponível, deram a Swoboda a base para suas pinturas atuais, mas são também o motivo para a sua perfeição técnica na execução, e sua harmonia e o equilíbrio nas formas e cores de cada quadro.

Mas desde 1930 vem pintando paralelamente em diversas técnicas e estilos expondo seus quadros na Alemanha, França e Brasil. Swoboda participou em muitas coletivas e leilões, foi diversas vezes premiado e realizou já 5 exposições individuais. a última no ano passado em São Paulo.

Atualmente Swoboda mostra com dois motivos diferentes. Uma série geométrica ou neoconcretista e a outra meio fantástica, quase surrealista com a mente aberta para o futuro e o espaço. Mas em tudo o que ele mostra sente-se a constante procura da beleza e harmonia e a vontade de realizar cada vez motivos novos e assim criando esta grande variedade de obras, dedicando seu tempo integral a pintura desde a idade de 65 anos.

As obras são executadas em tinta acrílica sobre cartão.

Jornal Valeparaibano, 15 de março de 1981

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